Crítica do final da novela Vale Tudo 2025
- Absolute Rio

- 18 de out.
- 3 min de leitura
O tiro de Odete e o tombo de Manuela
por Luciana Moisakis

Antes de mais nada, uma salva de palmas — e de pé — para Débora Bloch, essa mulher que carregou a novela nas costas com uma atuação im-pe-ca-vel.
Odete Roitman renasceu nela, mas o resto do elenco parecia ter saído de um curso livre de interpretação da Praça Saens Peña. O contraste foi gritante. Débora era cinema. O resto, sessão da tarde.
Bella Campos, nossa Maria de Fátima, ficou perdida entre o tom e o talento. Verde demais para um papel desse peso, acabou com um final morno, água de salsicha, que desidratou de vez a vilania que deveria incendiar o último capítulo. A Fátima original entregou um clímax histórico; essa, mal entregou o texto.
César, o vilão de ocasião, virou caricatura de si mesmo — teve momentos em que parecia um episódio dos Trapalhões.
E Heleninha, Nutella demais para o drama que carregava. Era pra ser uma alcoólatra em frangalhos, mas parecia uma influenciadora triste de taça na mão. Faltou víscera, faltou entrega, faltou tudo.
Leonardo, o silencioso da trama, entrou mudo e saiu calado. A não ser pelo playback da cena do acidente, o moço foi um figurante de luxo. Será que ganha menos por não falar? Pelo menos a expressão corporal estava no ponto — um consolo.
E Raquel, nossa heroína apagada, foi quase banida do roteiro depois de questionar o rumo da própria personagem.
Na versão original branca, com Regina Duarte, Raquel caiu uma vez e se levantou com dignidade.
Nesta, transformaram a personagem numa maratona de superação. Porque, claro, preto é forte, preto é foda, vamos mostrar resiliência.
Ah, pára.
Tia Celina, fiel ao seu destino, ficou no caritó, ao lado do seu eterno escudeiro Eugênio — porque Sebastian simplesmente evaporou, pelo menos aparentemente.
E o pobre Eugênio, que abriu mão da aposentadoria e de ser feliz para continuar lacaio da mansão solitária, onde ninguém lembrava nem de onde ele vinha.
Era hora dos humilhados serem exaltados. Eu, inclusive, apostei nele como o assassino. Mas sigamos.
O final, que deveria ser o grande desfecho, foi um desfile de constrangimentos com gosto de merchandising.
Casais de tornozeleira eletrônica felizes da vida — vergonha.
Casamentos em série, apressados, empurrados com trilha de comercial de margarina.
O casamento das meninas, que merecia destaque pela pauta, virou pano de fundo.
Heleninha, mesmo em liberdade, saiu marcada como “a que matou a mãe” — porque a autora simplesmente ignorou a inocência da personagem.
E aí abre o zoom pro casamento de Raquel.
A make da Thaís Araújo foi um caso à parte — cara laranja à la Tramp, um desastre estético digno de estudo. Parecia uma make aborígene.
Se há algo a se investigar nessa novela, é quem aprovou aquela base.
A sequência do crime foi o jogo dos sete milhões de erros.
Dizem que a autora escreveu dez finais — eu gostaria de ver os outros nove, pra descobrir se algum sobreviveu à lucidez.
O que foi ao ar parecia um surto coletivo com orçamento.
Odete e Marco Aurélio confabulando como matar um ao outro, e de repente, um loop de segundos pra informar logo esse povo que Marco Aurélio é quem atirou — mas, claro, ele não contava com o robe de seda à prova de balas confeccionado pela NASA.
Tudo orquestrado pela própria Odete, que armou o plano com a cumplicidade do Freitas, aquele mesmo que passou a novela sendo humilhado pelo patrão e ainda chorou quando o algoz quase morreu.
E a segurança do Copacabana Palace? Que merda, hein.
Nunca mais vou pra lá. rs
Vou de Airbnb — mais seguro.
E então, o desfecho da vergonha: Odete viva.
Sim, viva.
E com isso, a novela morreu.
A autora esqueceu que estava mexendo num patrimônio da dramaturgia brasileira, cujo auge — o símbolo máximo — era a morte da vilã.
Remake não é fanfic. Dá pra atualizar, ousar, até reinventar. Mas não dá pra reescrever o ápice que tornou a história o que ela é.
Tudo isso, dizem, pra agradar o público.
Pois é. Nem sempre ouvir a voz do povo dá certo.
Às vezes, o povo está apenas nostálgico — e você acaba escrevendo o epitáfio da própria obra.
Porque remake é campo minado:
se não faz merda na entrada, faz merda na saída.
E aqui, minha cara Manuela, vocês conseguiram as duas coisas.








Um texto desse vale tudo!!!